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Crianças da Clareira

primeiro raio da manhã
vai­te dentro da clareira
e acorda! acorda! acorda!
as crianças levadas da floresta
remelentas a boca enorme do bocejo
o coraçãozinho bate cada vez mais forte
levanta! levanta! levanta!hoje é dia de colheita!
sol ao meio dia
forte nos longos cabelos trançados das crianças
vão aos pulos em filinha canta e dança, bibibibabababa
no matagal desce a árvore para a lenha
no rio sobe o peixe para a janta
no campo vão leguelhumes hortalhiças e ovolho frito
faca bem afiada, o bode preto engole seco.trabalha! trabalha trabalha!
hoje é dia de colheita!
sol do pôr do sol!
a flauta o violino o alaúde
em habilidosas mãozinhas de criança
o bosque ecoa músicacheiro doce no ar! rostinhos gordos corados
dança e canta e rodopia em fileiras
bate palma! abre o sorriso! conta até três!
o bode preto treme outra vez.
hoje é dia de colheita!chega a lua cheia vai­te dentro da clareira
bebe! bebe! bebe!
a citra gostosa o vinho derrama nos pés descalços
as crianças levadas da floresta
fazem uma rodinha e giram. é uma ciranda!
bibibibabababa! é um festiço! é um feitiço! é uma maldita maldição!
o coraçãozinho batendo o mais forte
levanta! levanta! levanta!
hoje é dia de colheita!
bode preto no centro da rodinha
vai­te dentro da ciranda preso por cordas trançadas
treme treme treme até que para!facada certeira na garganta!
o sangue gostoso quentinho derrama nos pés descalços
as crianças levadas da floresta
enfiam-lhe inteiro num espeto!
(habilidosas mãozinhas de criança).a fogueira crepita o bosque ecoa música
cheiro salgado no ar!
queima! queima! queima! hoje é noite de festa!
vão entrando pessoas grandes feias
eca! eca! eca! pessoas grandes feias
cheias de pelos cheiro ruim de pecado
pessoas grandes feias no centro da rodinhavão­te dentro da ciranda presos por cordas trançadas
acorda! acorda! acorda!
facada certeira na garganta!
o corpo inteiro num espeto!
as lágrimas o sangue os pecados maus e ruins
derramam nos pés descalços! viva! hoje é noite de jantar!
habilidosas mãozinhas de criança mexendo a panela
cheia de braços e pernas e alho­poró
e legumes e peixes e banha feia eca
vai a citra e o sangue quentinho!
vai o vinho e a carne fumaçando!a fogueira crepita o bosque ecoa música
os gritos ecoam crépidos pela floresta
mas a música toca alta as risadas e a dança ninguém nunca vai saber.
é madrugada. as barriguinhas redondas como a lua.(burp!) pequeno arroto
e aquele soninho de comi­pra­me­acabaracabou. as crianças levadas vão em filinha
o coraçãozinho cada vez mais fracodeitam­se na relva vermelha da floresta.
o olho fica fraco, a lua se esconde no céu
primeiro raio de sol.
shh, não se houve mais nada.ninguém nunca vai saber.